Desafios do jornalismo local na cobertura de iniciativas culturais

Muitos veículos que estão no Mapa do Jornalismo Local costumam dedicar boa parte da sua cobertura à divulgação da agenda cultural da região e, em alguns casos, também produzem matérias sobre o trabalho dos artistas e coletivos culturais

Ariane Costa Gomes (reportagem) / Gisele Alexandre (edição)
02/03/2021
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Observar e retratar seu território. Essas são, sem dúvida, algumas das principais características do jornalismo local. Quando o veículo de comunicação produz conteúdo e divulga o trabalho de iniciativas culturais locais, o retrato do território ganha ainda novas cores e interpretações. Afinal, na maioria das vezes, o material produzido é feito por e para os moradores daquele território.

Muitos veículos que estão no Mapa do Jornalismo Local costumam dedicar boa parte da sua cobertura à divulgação da agenda cultural da região e, em alguns casos, também produzem matérias sobre o trabalho dos artistas e coletivos culturais. Apesar da importância dessa divulgação, que muitas vezes dá visibilidade para iniciativas que, provavelmente, nunca teriam a oportunidade na mídia tradicional, há muitas dificuldades na realização deste trabalho.

Prestes a completar 15 anos de existência, a Folha de Jandira é um dos veículos que se dedica a promover a cultura local. Porém, como contou a editora do jornal, Adriana Biazoli, 56, a falta de recursos financeiros dificulta o trabalho e limita a produção do conteúdo.

“Nosso jornal tem um faturamento modesto, e é isso que possibilita o custeio com transporte, compra de equipamentos e contratação de serviços”, diz Adriana.

Atualmente, com três colaboradores fixos, o jornal tem se dedicado a produzir conteúdos online e apenas algumas edições especiais ganham a versão impressa. Além da cidade de Jandira que, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), possui pouco mais de 127 mil de habitantes, o veículo também cobre as cidades de Barueri, Carapicuíba, Itapevi, Santana de Parnaíba e algumas notícias sobre o Estado de São Paulo.

Outro desafio enfrentado pelos veículos locais, que também está ligado à falta de recursos, são as coberturas dos eventos in loco. Muitos veículos se dedicam apenas a divulgar a programação, é o caso do site Taboão em Foco.

“Nossa principal meta é conseguir mostrar o evento cultural que vai acontecer para que mais pessoas consigam participar. Na prática, tentamos fazer o pré e pós evento”, afirma o jornalista Allan dos Reis, 41, do Taboão Em Foco.

A única grande cobertura cultural do veículo, que já faz parte da agenda fixa, acontece no mês de abril, quando é realizada a encenação da Paixão de Cristo no município, evento que há dois anos está suspenso por conta da pandemia da Covid-19. O site Taboão Em Foco tem pouco mais de dez anos e além de cobrir Taboão da Serra, cidade com quase 300 mil habitantes, também cobre Embu das Artes, Embu-Guaçu, Itapecerica da Serra, Juquitiba e São Lourenço da Serra.

Do presencial para o virtual

O setor cultural foi bastante impactado pela pandemia. Com a suspensão das atividades presenciais e o distanciamento social, muitos artistas tiveram que reinventar o modo de produzir e compartilhar sua arte com o público. As lives, formato de transmissão ao vivo de vídeos pela internet, ganharam força nas redes sociais e muitos espaços culturais passaram a ter apenas programações virtuais.

Seguindo a mesma tendência, o modo de divulgar cultura também teve que se adaptar. Os veículos de jornalismo local que tinham como principal pauta as agendas culturais, precisaram diminuir o ritmo, já que o número de shows, peças teatrais, festas, debates etc passaram a ser cada vez menos frequentes.

“Criamos a seção Faixa Cultural, mas a pandemia acabou desmobilizando já que não tínhamos mais atividades culturais ao longo de 2020 e boa parte de 2021. A ideia é voltar reforçado em 2022 com a atualização da agenda cultural”, conta Allan, do Taboão em Foco.

No site Folha de Jandira, as publicações sobre cultura voltaram com mais frequência em 2021. Além da agenda cultural, boa parte do conteúdo foi focada na história e no trabalho de artistas jandirenses, profissionais que nasceram ou que desenvolveram seus trabalhos na cidade.

“Sempre disponibilizamos espaço no site quando somos contatados por blogs ou pessoas que querem divulgar [iniciativas culturais]. Em especial, se o evento tem entrada franca ou se for para angariar alimentos”, afirma Adriana.

Se ficou difícil para quem já estava há anos na estrada, como será que os veículos que surgiram pouco antes do início da pandemia lidaram com esse cenário?

“Foi difícil começar um veículo e depois vir a pandemia. Foi estranho porque tudo fechou, mas por outro lado, produzimos um jornalismo de qualidade”, conta Wellington Alves, 36, jornalista e sócio-proprietário do GRU Diário, portal de notícias de Guarulhos lançado em fevereiro de 2020, pouco mais de um mês antes de ser decretada pandemia no Brasil.

Apesar de ter sido pego de surpresa, Wellington afirma que a crise sanitária deu ainda mais destaque para o seu canal. “A pandemia impulsionou nossos conteúdos e ajudou a crescer o número de acessos. Por exemplo, em abril de 2020 tivemos mais de 78 mil acessos”, diz. O GRU Diário se dedica a cobrir o que acontece em Guarulhos, segunda maior cidade do Estado de São Paulo com mais de 1,2 milhão de habitantes. Entre os eventos divulgados pelo veículo está o CarnaRock, show com bandas de rock alternativo realizado em setembro de 2021 por causa da pandemia.